Pós-Graduação
em Ensino de Ciências – Mestrado Profissional
Disciplina: Tendências Contemporâneas de Currículo
Professora: Rita de Cássia M. T. Stano
Alunos: Paulo Márcio Secundo dos Santos Itajubá,
abril de 2012
Waldemir de Paula Silveira
A POLÍTICA CURRICULAR E O
CURRÍCULO PRESCRITO
Resumo do Capítulo 5 do livro: O Currículo
- Uma reflexão sobre a prática - Autor: José Gimeno Sacristán
O Currículo Prescrito como Instrumento da Política Curricular
Um currículo educacional não existe fora
do contexto histórico social ao qual ele se destina. A política e os mecanismos
administrativos de um dado contexto intervêm na modelação do currículo e
revelam tanto hegemonia do Estado quanto às implicações de determinadas
concepções de educação. A ordenação do currículo reflete as regulações
ordenadoras demandadas pela sociedade e pelo Estado.
Por isso mudar a proposta curricular supõe
reconhecer e de certa forma atender as solicitações de transformações
especificadas pela sociedade. Mudar a prática educativa pressupõe alterar a
política sobre o currículo.
Essas modificações interferem diretamente
no papel da escola e do educador e pressupõem negociações (didáticas,
disciplinares, pedagógicas, etc.) reorientem a prática pedagógica das
sociedades democráticas. Uma transformação da proposta curricular, precisa, portanto,
de coerência e solidez para concretizar-se de forma eficiente.
Alguns aspectos são predeterminantes para
regular intervenção numa proposta curricular: as formas de regular a
distribuição de conhecimento; a estrutura de decisões centralizadas ou descentralizadas;
aspectos sobre os quais esse controle incide; mecanismos implícitos ou
explícitos pelos quais se exerce o controle sobre a pratica e a avaliação da
qualidade do sistema educativo; e, as políticas de inovação (assistência à
escola e aos profissionais da educação como estratégias para melhorar a
qualidade do ensino.
Funções das Prescrições e Regulações
Curriculares
Em
primeiro lugar é senso comum a compreensão de que a compreensão de que a
prescrição de mínimos e de diretrizes curriculares pressupõe um projeto de
cultura comum em uma sociedade
(identidade nacional). Esse núcleo comum implica conteúdos,
aprendizagens básicas e orientações pedagógicas que são exigências
curriculares, podem ser completadas por uma parte diversificada, mas não podem
ser substituídas.
Se a realidade
implica uma grande desigualdade social e uma ampla heterogeneidade (cultural,
étnica, etc) a imposição de um núcleo comum solidifica a justificativa a
escolaridade como obrigatória a fim de impor uma cultura normalizadora, ou
seja, os interesses de um setor social definido.
O Currículo Mínimo e a Igualdade de
Oportunidades
A imposição de um currículo mínimo impõe
noção de que apesar das diferenças sociais todos os alunos, nas sociedades em
que a escolarização é obrigatória, da rede pública ou privada de ensino, têm as
mesmas oportunidades de aprendizagem e de sucesso social.
A concretização
desse prognóstico do potencial equalizador do currículo mínimo depende da
existência ou não de meios eficazes de controle sobre a qualidade da prática
escolar, inscreve-se, portanto, como significação cultural e social dos fins e
objetivos da educação.
A regulação do
currículo (currículo mínimo, conteúdos e códigos, avaliação, progressão
escolar, orientações pedagógicas, etc.) indicam os caminhos prescritos obrigatórios em si mesmos
e também ordenam as possibilidades optativas (diversificação) dentro dos quais
as escolas podem se organizar.
Vê-se dessa forma
duas funções essenciais da regulação curricular prescrever os mínimos e
orientar o processo de ensino e de aprendizagem. Na prática, contudo,
encontra-se uma política contraditória, pois geralmente e proposta curricular
não consegue controlar os mínimos obrigatórios e nem orientar o processo
pedagógico. Dentre os fatores que levam a
esse fracasso alega-se a qualidade da formação do professor.
O Currículo Prescrito como Via de Controle
sobre a Prática de Ensino
Concretizar
a ordenação curricular dentro do sistema educativo supõe pré-condicionar o
ensino, ou seja, mediatizar as mudanças prescritas a serem realizadas, a fim de
aperfeiçoar a técnica pedagógica.
O aperfeiçoamento
da educação via mudanças curriculares pressupõe um plano de aperfeiçoamento
global e amplo, logo além o estabelecimento de um currículo mínimo e de
orientações pedagógicas com concernentes tem-se a pretensão de um
desenvolvimento técnico-pedagógico adequado ao mesmo.
Tudo isso
engendra um esquema de controle do processo pedagógico que se extremamente
centralizado gera submissão e extrema dependência pedagógica, o que tem várias
conseqüências negativas. Em resumo essas conseqüências denotam a
incapacidade de a escola e os profissionais da educação de se
apropriarem das orientações pedagógicas de forma crítica, criativa e
construtiva.
Isso compromete a
qualidade da educação e dos mecanismos de controle dessa educação. Na Espanha,
por exemplo, muitas reformas curriculares e os mecanismos de inspeção da
qualidade da educação resultaram em instrumentos burocráticos e estéreis. Os
professores muitas vezes não conseguem encontrar orientações pedagógicas que
condicionem o aperfeiçoamento da qualidade da educação proposta pelas reformas
curriculares.
Controle de qualidade
A ordenação e a prescrição de um
determinado currículo por parte da administração educativa é uma forma de
propor o referencial para realizar um controle sobre a qualidade do sistema
educativo. Tudo isso é controlado pela regulação administrativa (que ordena como deve ser a prática escolar – até
sob a forma de sugestões), avaliando essa prática de currículo pela inspeção e
por avaliações externas, ou seja, controle
do processo e controle do produto.
A avaliação
centrada no controle regula e ordena as condições da prática, mas não pode
saber se essas condições são realmente cumpridas.
O controle sobre
os produtos (avaliações) realizado por agentes exteriores confere certa
autonomia aos professores e as instituições de ensino. Ambos os tipos de
controle cruzam-se respectivamente com a centralização
– descentralização da educação.
A favor da descentralização, ainda que ela não
acarrete obrigatoriamente, maior participação e eficiência, surge à compreensão
que ela pode estimular e acomodar as atuações mais pontuais da comunidade
escolar, mas não é condição suficiente para melhorar a qualidade do ensino.
O que se recomenda para o aperfeiçoamento da
prática educativa é um ponto
intermediário entre
centralização e descentralização curricular. Skilbeck (1972) distingue três
tendências (modelos) básicas dessa busca por uma intermediação: o modelo racional
dedutivo (mais centralizado); o
modelo racional interativo (mais
intermediativo); e o modelo intuitivo (extremamente descentralizado).
Prescrição e Meios que Desenvolvem o
Currículo
As orientações e exigências
curriculares só interferem nas práticas dos professores nas aulas de maneira
indireta, pois ainda que desejem documentos oficiais os profissionais da
educação já são detentores de concepções psicopedagógicas e políticas firmemente arraizadas. Por isso
quando ocorre uma mudança curricular são planejadas uma série de cursos de
reciclagem(atualização) numa tentativa de implantar as orientações pedagógicas
desejadas.
Os meios
didáticos que elaboram as diretrizes curriculares e os mínimos prescritos são
mecanismos mais eficazes de regulação e de controle dos códigos pedagógicos do
que uma inspeção autoritária e burocrática.
A
Concretização Histórica de um Esquema de Intervenção na Espanha
Na
Espanha a crescente democratização do acesso à educação exigiu reformas
curriculares que atendessem a uma ampla heterogeneidade dos alunos. Com ênfase
em reorientações curriculares no ensino primário e um projeto pedagógico
global. O ensino médio e o superior ainda foram devidamente remodelados.
·
Necessidade de unificar os conteúdos das escolas para alcançar
o objetivo de uma escola nacional.
·
1938 à Ordenação do currículo no qual há uma forte
preocupação pelo controle ideológico das escolas.
·
1945 à Ministério da Educação dita às regras metodológicas
obrigatórias nas escolas públicas e as normativas nas privadas, mas deixa
margem para a iniciativa do professor.
·
1953 à Intenção de controle ideológico e técnico da
prática. O intervencionismo pedagógico se manifesta claramente na regulação
curricular.
è Questionários Nacionais
do Ensino Médio: determinam as noções de conteúdo, as leituras essenciais que
os alunos deviam realizar, os cursos que se tratarão, etc.
·
1957 àSe especificava o número de unidades didáticas que
semanalmente comporiam o horário em cada cadeira: “A unidade didática constará
de três quartos de hora de classe e meia hora de permanência; durante esta
última, o aluno, à vista do professor que tenha a classe a seu cargo estudará e
fará exercícios sob a direção do professor.”
·
Expressam procedimentos de controle severos por parte do
Ministério, da Inspeção, da Diocese e do Movimento.
·
1964 à Paralelismo entre o formato de prescrever o
currículo por parte da administração educativa e a forma de o professor abordar
a organização de trabalho escolar, mantendo-se um mesmo esquema de plano para
duas fases ou aspectos muito distintos: a prescrição curricular e a
racionalização didática.
·
1970 à Programas e orientações pedagógicas seriam
estabelecidos pelo Ministério a Educação.
·
A partir de 1970 à As disposições
administrativas tem uma forte carga pedagógica. O formato de currículo
prescrito que finalmente se difunde contém expressões de objetivos globais,
objetivos muito-definidos, orientações metodológicas gerais e sugestões de
atividades específicas para determinados conteúdos.
·
1981-1982 àEstabelecimento da
Democracia e a aprovação da Constituição de 1978. A inspeção do Estado será
encarregada da vigilância do cumprimento das normas.
·
Nestas ordenações legais aparecem os seguintes códigos
pedagógicos
è A idéia de ciclo como
unidade organizativa de dois cursos, ficando nas mãos da administração
educativa do estado e das Comunidades Autônomas poder detalhar distribuir os
ensinos mínimos em grau.
è Reforça-se um discurso
favorável à autonomia das escolas e dos professores na definição do currículo.
è Evolução e desenvolvimento
psicológico do aluno são critérios da seleção de conteúdos e métodos.
è Introduz uma
diferenciação dos conteúdos prescritos: conhecimentos conceituais,
procedimentos e atitudes.
è Incluem-se os critérios
de avaliação que estabelecem “o tipo e o grau de aprendizagem” que se espera
que o aluno consiga.
A Homogeneização dos
Materiais Didáticos
·
1945 à ideologia autoritária: “Os livros de uso escolar em
todas as escolas espanholas deverão ser aprovados pelo Ministério da Educação
Nacional, prévios assessoramento técnico quanto ao seu conteúdo e confecção,
sem os quais não poderão ser utilizados no primeiro ensino com textos, nem como
livros de leitura”.
·
1958 à se especificava que o não comprimento das
disposições relacionadas com esta matéria seria motivo de falta grave ou muito
grave, motivo de fechamento para as escolas privadas e de retirada de permissão
de edição de livros-textos para a editora que nele incorresse.
·
É muito evidente a pretensão de controlar os mateiras de
consulta e de trabalho de professore e de alunos que se expressa nestas
disposições como meio efetivo de filtrar as propostas pedagógicas que se podem
fazer dentro do estreito e íntimo campo de aula, onde é muito difícil chegar
com qualquer instrumento de controle.
·
Através do intervencionismo pedagógico se punha de manifesto
a ideologia de controle que não evitou maus livros textos.
·
A pretensa política de controle e homogeneização do currículo
por este procedimento acaba em intervenção pedagógica e ideológica.
Inspeção Educativa
·
Função não é apenas de caráter técnico-pedagógico, mas tem
uma função política quando é exercida a serviço de uma opção curricular.
·
Lei de 1945 à “órgão encarregado de
orientar e dirigir o professor no exercício de sua função docente”, mas também
como um órgão de vigilância da administração sobre as escolas, que tem o dever
de cumprir e fazer cumprir, como Delegado da Autoridade superior, as
disposições legais relativas ao ensino.
·
O estilo de exercício da função depende das pessoas que a
desempenham, mas a definição institucional da mesma dá ênfase ao controle
processual e ao seu papel vigilante, principalmente levando em conta que a
política curricular é intervencionista em aspectos pedagógicos. A função
inspetora focou subjugada não apenas a um modelo político, mas a uma forma de
dirigir o currículo muito dependente da ordenação administrativa que serve a
uma determinada opção política, pois política educativa e burocracia
administrativa na Espanha foram inseparáveis.
Algumas Conseqüências do
Modelo
·
Trata-se de uma intervenção burocrática e tecnocrática do
currículo, que amplia a espaço de decisões do nível burocrático e político,
diminuindo os espaços de decisão dos principais protagonistas da adaptação
última do currículo para a prática, que são os professores.
·
A administração regula o currículo determinado conteúdos,
aprendizagens que consideram básicos e aspectos relacionados com a educação.
·
A intervenção se produz igualmente na hora de propor
sugestões metodológicas, algumas vezes de maneira genérica e outras de forma
mais precisa, relativas a conteúdos concretos.
O sistema educativo fica sujeito aos vaivens de correntes pedagógicas,
modismos passageiros que o administrador de turno propõe-impõe.
·
O modelo administrativista de comunicação teoria-prática
deixa nas mãos da burocracia a definição e a operacionalização de modelos
pedagógicos que são, na maioria dos casos, propostas ineficazes, já que se
esgotam em mero enunciado. Não concede ao sistema educativo a capacidade de se
organizar pedagogicamente; não combina com um professorado competente que,
nutrido de propostas e ideias pedagógicas, realiza modulação da prática
pedagógica em suas escolas e em suas aulas. A relação de controle contamina a
função orientadora e ambas acabam sendo bastante ineficazes.
·
Modelo desprofissionalizador do professor ou, no mínimo,
duvidosamente profissionalizador. O papel do professor fica relegado à
concretização das diretrizes metodológicas em suas classes, vigiados e
orientados pela inspeção. Configura-se um modelo de profissional “executor” e
adaptador de normas e diretrizes ao qual resta escasso espaço de
desenvolvimento.
·
Produz uma relação unidirecional e individualista entre o
professor e a burocracia que presta orientações precisas de ordem metodológica
para realizar o ensino “adequado”. A responsabilidade do professor reside em
responder a diretrizes cada vez mais específicas. As próprias reformas se
centram mais nos professores que nas escolas.
·
Supõe a impossibilidade de que os docentes participem nos
conteúdos, que são decididos no exterior.
·
Deixa-se nas mãos da inspeção o desenvolvimento, a definição,
a orientação e a vigilância do cumprimento de prescrições e de orientações
educativas.
·
O controle real do conhecimento distribuído fica nas mãos dos
materiais didáticos. Todo material a ser usado pelo professor e pelo aluno deve
ser aprovado pela administração educativa, ou simplesmente, não se faz nada
para dispor de materiais alternativos.
·
A prescrição permite a realização de quatro objetivos
básicos: ordena o sistema, pretende controlar o currículo, esclarece os
conteúdos e métodos para o professorado e regula as condições de obtenção das
validações e títulos.
·
Para progredir nessa direção, são necessárias algumas
condições e linhas de atuação política:
è Menos dirigismo
burocrático do processo;
è Mais qualidade do
professorado;
è Desenvolvimento das
estruturas de funcionamento coletivo nas escolas;
è Maior controle
democrático;
è Mecanismos e dinâmicas de
inovação permanente do currículo apoiadas na criação de materiais;
è Flexibilidade do currículo e adaptabilidade às
condições mutantes da cultura e da sociedade.